23/02/2021
A indicação do general Joaquim de Silva e Luna para presidir a Petrobras, feita na sexta-feira, 19, pelo presidente Jair Bolsonaro – após a estatal reajustar pela quarta vez no ano os preços do diesel e da gasolina praticados nas refinarias do país – acendeu um sinal de alerta entre analistas e operadores do mercado de etanol, cujo comportamento nos postos de gasolina tendem a acompanhar as oscilações do mercado de combustíveis fósseis.
A decisão depende da aprovação do Conselho de Administração da estatal. Mas, ainda com a memória recente de governos anteriores, quando o controle de preços da gasolina gerou perdas ao setor, os especialistas passaram a considerar o risco de uma nova interferência do governo na política de preços de combustíveis da empresa.
“Há três meses, a gente não discutiria se pode sofrer ou não uma intervenção de preços mais dura. Isso foi ficando cada vez mais forte e, desde a semana passada, é um assunto a discutir. Houve uma mudança muito grande de cenário, e dá para se duvidar bem mais agora do viés com que o governo trabalha”, aponta o analista de mercado de óleo e gás da StoneX, Thadeu da Silva.
Segundo ele, os preços praticados no mercado interno já vinham abaixo da paridade internacional desde o final do ano passado, o que tem diminuído o interesse privado pela importação combustíveis fósseis.
“A coisa começou a descambar mesmo a partir de novembro e dezembro, quando o preço internacional se recuperou e eles (Petrobras) pararam de atualizar”, explica o analista. O último reajuste, publicado na semana passada, corrigiu justamente essa defasagem – porém sem estímulo às importações privadas.
“O preço está em paridade, mas como é que alguém importa com o presidente da República trocando o presidente da Petrobras? Isso traz uma incerteza muito grande, principalmente em relação ao suprimento desse combustível”, completa o analista.
Em outubro do ano passado, a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom) já alertava para a diferença entre os preços praticados pela Petrobras no mercado interno em relação às cotações internacionais.
“No contexto concorrencial do mercado de comercialização de combustíveis, o preço praticado pela Petrobras inviabiliza economicamente as importações e, consequentemente, no médio prazo, pode resultar na saída dos únicos concorrentes do mercado”, afirmou a entidade, em nota, na qual destaca que a estatal detém 98% de participação no mercado de refino.
Em boletim divulgado no próprio dia 19 de fevereiro, o diretor da Archer Consulting, Arnaldo Correa, foi categórico: “Tudo indica que o setor sucroalcooleiro vai acabar pagando indiretamente o preço”. Segundo ele, voltar a ter preços controlados seria um retrocesso extremamente preocupante, comprometendo um cenário de rentabilidade traçado para o etanol até aqui.
“Se a Petrobras abandonar o sistema de formação de preço do combustível, desaparece a sinalização para o setor sucroenergético de qual seria o preço provável da gasolina ao consumidor e, consequentemente, de se ter uma ideia do preço do etanol ou mesmo da rentabilidade”, explicou o consultor, à Globo Rural.
Ainda assim, Correa, pelo menos por enquanto, mantém suas projeções para a produção no Centro-Sul. Em 12 de fevereiro, falava em moagem de cana em 578 milhões de toneladas, 27,4 bilhões de litros de etanol e 35,3 milhões de toneladas de açúcar, com mais de 75% do volume para exportação já fixados pelas usinas.
O diretor da Archer Consulting demostra preocupação com outra intenção manifestada pelo presidente Jair Bolsonaro, de “meter o dedo” no setor de energia elétrica. Para Arnaldo Correa, essa postura do governo pode ter consequências em médio prazo.
“A interferência traz uma instabilidade jurídica muito grande para aqueles que, porventura, poderiam nesse momento estar pensando em investir no mercado energético no Brasil, seja de usina, de distribuição, seja do que for”, diz ele.
FONTE: NOVACANA.COM